TRF-4 condena Bolsonaro e União a pagar R$ 2 milhões por declarações consideradas racistas

Ex-presidente é responsabilizado por danos morais coletivos após comparar cabelo de apoiadores negros a “criatório de barata”; decisão é unânime, mas cabe recurso

O ex-presidente Jair Bolsonaro foi condenado pela 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) ao pagamento de R$ 1 milhão por danos morais coletivos, após declarações consideradas racistas durante o período em que ocupava a Presidência da República. A decisão, divulgada nesta terça-feira (17/9), também condena a União a pagar o mesmo valor, totalizando R$ 2 milhões em indenizações.

A ação civil pública foi movida pelo Ministério Público Federal (MPF) e pela Defensoria Pública da União (DPU), que acusaram Bolsonaro de ter proferido declarações públicas com teor de preconceito, discriminação e intolerância contra pessoas negras. O julgamento teve decisão unânime, mas o ex-presidente ainda pode recorrer.

Declarações consideradas ofensivas

Três falas do ex-presidente foram analisadas, todas feitas entre maio e julho de 2021, em lives transmitidas nas redes sociais e em eventos oficiais no Palácio do Planalto. Em uma delas, Bolsonaro comparou o cabelo crespo de um apoiador negro a um “criatório de barata“, acrescentando, em tom de deboche, que o apoiador deveria tomar ivermectina para matar piolhos. Em seguida, riu da situação, mesmo diante da repercussão negativa.

Posteriormente, o então presidente convidou o mesmo apoiador para uma live, classificando as declarações como “piadas”, questionando quantas vezes ele tomava banho por mês e ironizando que ele poderia ser deputado “se criassem cota para feios”.

Em outros episódios citados no processo, Bolsonaro afirmou ter visto uma barata no cabelo de outro apoiador negro, e perguntou a um terceiro o que ele “criava” na própria cabeleira.

Apesar de os apoiadores envolvidos terem afirmado não se sentirem ofendidos, o MPF e a DPU argumentaram que as falas de Bolsonaro ultrapassaram os limites da ofensa individual, configurando uma ofensa estigmatizante coletiva. Para os autores da ação, trata-se de “racismo recreativo”, expressão usada para definir condutas discriminatórias disfarçadas de humor.

Impacto coletivo

Durante o julgamento, a procuradora da República Carmen Elisa Hessel afirmou que as manifestações de Bolsonaro “reforçam estereótipos negativos” e contribuem para o aumento do preconceito racial, principalmente por terem sido feitas por um chefe de Estado. Segundo ela, o impacto dessas declarações vai além das pessoas diretamente envolvidas e atinge toda a comunidade negra.

Defesa

A advogada de Bolsonaro, Karina Kufa, declarou que as falas foram “brincadeiras de mau gosto”, mas que não foram capazes de gerar dano coletivo. Ela destacou que o próprio apoiador mencionado nas falas manteve relação de proximidade com Bolsonaro e declarou não ter se sentido ofendido.

Na ação, o MPF e a DPU pediram indenizações de até R$ 15 milhões (R$ 5 milhões de Bolsonaro e R$ 10 milhões da União), mas o tribunal decidiu por valores menores. Os R$ 2 milhões serão destinados a um fundo público vinculado a políticas de promoção da igualdade racial.

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