Goiás acompanha tendência nacional e fortalece o direito ao vínculo familiar nos primeiros meses de vida
Até recentemente, mães de bebês prematuros ou com complicações de saúde começavam a contar os 120 dias de licença-maternidade ainda no hospital — muitas vezes, sem sequer poder segurar os filhos no colo. A rotina, em vez do aconchego do lar, era dividida entre boletins médicos e os sons constantes da UTI neonatal.
Esse cenário começa a mudar com a entrada em vigor da Lei Federal nº 15.222/2025, que altera o início da contagem da licença em casos de internações prolongadas relacionadas ao parto. Agora, o prazo de 120 dias só começa após a alta hospitalar da mãe e/ou do bebê, garantindo que o tempo da licença seja vivido em casa, como deveria ser.
Números preocupam e reforçam necessidade da mudança
De acordo com o Ministério da Saúde, o Brasil registrou 303.477 nascimentos prematuros em 2022, o que representa cerca de 12% dos partos do país. A maioria desses bebês permanece internada entre 30 e 50 dias, podendo ultrapassar dois meses nos casos mais graves.
Em Goiás, os números seguem a média nacional: foram 10.502 prematuros em 2023 e 9.086 até meados de 2024, com uma taxa estadual de prematuridade de aproximadamente 11,1%.
O que muda com a nova lei
Antes, o início da licença-maternidade era contado a partir da data do parto — ou até antes — mesmo que o recém-nascido precisasse de cuidados intensivos. Com a nova regra, casos de internação superior a duas semanas não descontam esse tempo da licença.
O novo texto legal também altera o artigo 71 da Lei nº 8.213/1991, garantindo que o salário-maternidade seja pago durante todo o período de internação da mãe ou do bebê (por mais de duas semanas) e por mais 120 dias após a alta — com abatimento do que já tenha sido pago antes.
Direito assegurado — mas sem efeito retroativo
A nova regra não é retroativa. Isso significa que só vale para partos e internações ocorridos a partir de 29 de setembro de 2025, data da publicação da lei.
Têm direito à nova contagem:
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Mulheres com carteira assinada;
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Seguradas do INSS (autônomas, MEIs, contribuintes individuais);
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Adotantes, em casos específicos.
Ficam fora da nova regra, por enquanto:
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Mulheres que atuam como PJ e não contribuem com o INSS;
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Servidoras públicas (que seguem regras próprias de seus entes federativos).
Opinião dos especialistas
Para o advogado trabalhista Filipe Augusto Moura Meireles, a lei corrige uma falha histórica:
“O maior avanço é que a mãe não perde mais parte da licença enquanto ela ou o bebê estão internados. A contagem começa a partir da última alta”, explica.
Ele destaca ainda que transformar esse entendimento — antes restrito a decisões judiciais — em lei federal garante mais segurança jurídica para famílias, empresas e o próprio INSS.
Do ponto de vista emocional, a mudança também é significativa. O psicólogo Paulo Rosa lembra que o nascimento já é considerado, segundo Freud, o primeiro trauma da vida humana.
“Quando a separação da mãe e do bebê é agravada por complicações médicas, estamos diante de um ‘trauma sobre trauma’. O tempo da licença precisa ser de convivência, não de tensão hospitalar”, defende.
Como garantir o direito
Para assegurar a nova contagem do prazo, a mãe precisa apresentar:
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Declaração ou relatório do hospital com as datas de internação e alta;
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Certidão de nascimento do bebê;
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Documento de identidade.
Se houver recusa da empresa, os caminhos são:
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Protocolar o pedido formalmente (com cópia assinada ou por e-mail);
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Buscar apoio no sindicato da categoria, Defensoria Pública, Ministério do Trabalho ou entidades como a ONG Prematuridade.com;
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Acionar a Justiça do Trabalho, se necessário — não é obrigatório advogado, mas o apoio jurídico pode facilitar o processo.
Mais tempo, mais vínculo
O objetivo da nova lei é claro: garantir que mães e bebês tenham tempo real juntos, em casa, longe do ambiente hospitalar. “É uma vitória silenciosa, mas com grande impacto no desenvolvimento da criança e na saúde mental da mãe”, conclui o psicólogo Paulo Rosa.
Especialistas já apontam o próximo passo: estender a licença-maternidade para seis meses a todas as mulheres, com estabilidade no emprego pelo mesmo período após o retorno.
Até lá, cada avanço deve ser celebrado — principalmente quando representa mais tempo, mais presença e mais cuidado no início da vida.